O ex-ministro
da Saúde e médico cardiologista Dr. Adib Jatene, faleceu aos 85 anos, na
noite de sexta-feira, 14 de novembro, em São Paulo.
Dr.
Jatene foi um dos criadores do Instituto Dante Pazzanese, um dos
principais centros de referência no tratamento de cardiopatias (doenças
do coração) e, atualmente, era diretor-geral do HCor e um dos pioneiros da cirurgia do coração no Brasil. Em 1992, o médico tornou-se ministro da Saúde no governo do presidente Fernando Collor, entre fevereiro e outubro.
Em 2011, esteve no Rio de Janeiro e visitou a Clínica da Família Sérgio Vieira de Mello, no bairro do Catumbi.
Segue texto publicado no jornal O Globo.
O exemplo do Rio (Opinião)
ADIB JATENE
Quando ministro da Saúde, em 1996, consegui implantar o Programa de Saúde da Família em São Paulo. Sempre defendi
que esse programa, que vinha sendo implantado em municípios do interior
do Nordeste e do Norte, deveria atingir as áreas metropolitanas onde a
industrialização tardia, e a conseqüente urbanização, a partir das
administrações de Getúlio e Juscelino, fez com que grandes massas de
população se concentrassem nas grandes cidades, em áreas onde os
profissionais de que elas necessitam não aceitam morar.
0 primeiro módulo
implantado em Itaquera, em parceria do governo do Estado e do Ministério
da Saúde com as irmãs do Hospital Sta. Marcelina, mostrou o acerto da
formulação.
Depois que saí do
Ministério, usando a Fundação Zerbini, do InCor, conseguimos implantar
19 equipes na região de Vila Nova Cachoeirinha e 33 equipes em
Sapopemba, agregando odontologia e saúde mental em todas as unidades, e
duas equipes de 12 especialistas, uma em cada um dos dois bairros, além
de Casa de Parto em Sapopemba.
Nos anos seguintes,
essa estratégia foi ampliada, chegando hoje a mais de 2.200 equipes,
cobrindo perto de 60% da população alvo, e em todas as áreas onde o
programa se implantou com grande receptividade.
Por isso, quando
visitei, há anos, um módulo mantido por Ezio Cordeiro, na Faculdade de
Medicina da Universidade Estácio de Sá, me dei conta de que na cidade do
Rio menos de 3% da população se beneficiavam do programa Saúde da
Família. Essa sensação de falta de sensibilidade sempre me incomodou.
No último 18 de
outubro estive no Rio para assistir à Conferência Internacional sobre
Determinantes Sociais de Saúde, proposta da OMS que o Brasil acolheu com
entusiasmo no governo Lula, criando uma das primeiras comissões
nacionais e gerando alentada publicação sobre o assunto, coordenada por
Alberto Pelegrini, da Fiocruz.
Nesse dia, em contato
com o secretário Hans Dohmann, tomei conhecimento de que ele iria
inaugurar, no dia seguinte, no Catumbi, a 44ª Clínica de Saúde da
Família, de um total de 70, que pretendem implantar até o final da atual
administração. Mostrei interesse em visitar a unidade.
Devo confessar minha
surpresa ao encontrar belíssima obra acoplada a uma magnífica creche. A
distribuição dos cômodos e a programação visual, a excelência da
construção e todos os recursos ali colocados, que fiz questão de
visitar, deixaram-me emocionado.
Faz bem à alma ver
que, em nosso país, as pessoas começam a receber das autoridades o
respeito e a consideração que merecem. Vi-me diante da incorporação de
todos os conceitos que, ao longo do tempo, foram implantados no PSF,
conseqüência do amadurecimento do programa.
Além das instalações
clássicas de nossas unidades básicas, visitei uma sala de raios X, outra
de ultrassom, permitindo acompanhar as gestantes.
Outra sala tinha três
equipes completas de odontologia. O que mais me agradou foi assistir
aos agentes comunitários, já selecionados, recebendo instrução sobre
como devem atuar na comunidade desde o cadastramento da população, à
busca de doenças preexistentes como hipertensão, diabetes e tuberculose.
Também devem identificar as gestantes, verificar as consultas de
pré-natal, controlar a carteira de vacinação de todas as crianças,
identificar fatores de risco, o que se consolida com a visita mensal a
cada uma das casas de seu núcleo de 200 famílias.
Saí dessa visita com a
esperança renovada. Quando o Rio de Janeiro se envolve com esta
seriedade, cobrindo uma lacuna em que, ao contrário de esperar que as
pessoas busquem hospitais superlotados, ir ao encontro dessas
populações, com instalações que exprimam o respeito que o administrador
público deve ter pelas pessoas, não há como não se emocionar.
Costumo dizer que o
Programa Saúde da Família não existe para beneficiar politicamente os
administradores, mas, certamente, engrandecerá aqueles que, com sua
adesão ao programa, proclamam o respeito e a consideração que têm com as
pessoas que sofrem e se regozijam com os novos tempos, que lhes são
oferecidos. Saí não só com a esperança renovada, mas com a certeza de
que Heloísa Machado e Fátima de Souza, que me conquistaram quando
ministro para o Programa, vão sentir-se recompensadas de todas as
agruras para chegar até aqui.
ADIB JATENE é médico e foi ministro da Saúde.
Fonte: Jornal o Globo , 10 de novembro de 2011.
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